A Internet é palco de constantes transformações e debates, especialmente no que se refere à regulação e aos contratos que regem a relação entre os provedores de serviços online e os usuários.
Em primeiro lugar, é fundamental destacar o papel dos Termos de Serviço ou Termos de Uso, que se configuram como contratos de adesão, apresentados unilateralmente pelas plataformas digitais. Talvez o aspecto mais prevalente em comum nesses termos seja a limitação de responsabilidade das plataformas e a ausência de garantias oferecidas pelos provedores de serviços online. Estas cláusulas são frequentemente redigidas em destaque, utilizando caracteres em caixa-alta ou em negrito, para enfatizar sua importância.
Estas cláusulas de limitação de responsabilidade buscam, em essência, isentar o fornecedor de serviços online de qualquer responsabilidade civil que possa surgir do uso dos serviços oferecidos ou, alternativamente, limitar eventuais indenizações a um valor pré-fixado. O conteúdo dessas cláusulas é geralmente extenso e abrangente, prevendo uma vasta gama de situações em que o provedor possa ser responsabilizado, utilizando termos como "quaisquer", "todos" ou "nenhum", com o intuito de abarcar todos os possíveis danos sofridos pelos usuários e terceiros.
Como exemplo, os Termos de Serviço de uma conhecida bigtec de vídeos estabelecem que os usuários concordam em isentar a plataforma de qualquer ação judicial, danos, obrigações, perdas, custos ou dívidas. Além disso, a plataforma se exime de responsabilidade por danos diretos, indiretos, incidentais, especiais, punitivos ou imprevistos resultantes de erros, equívocos ou imprecisões de conteúdo, danos pessoais ou materiais, entre outros.
No entanto, é importante ressaltar que o Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seu artigo 51, I, admite a limitação da responsabilidade indenizatória em situações justificáveis quando o consumidor for pessoa jurídica. Dessa forma, é necessário fazer uma distinção entre a limitação de responsabilidade justificável e a isenção total de responsabilidade, como é o caso da cláusula da bigtec citada anteriormente. Quando um provedor de serviços online estabelece uma previsão contratual de irresponsabilidade total, tal cláusula deve ser considerada nula de pleno direito.
Ademais, é comum encontrar nos Termos de Uso cláusulas que fixam um valor indenizatório simbólico ou quase simbólico, que acabam por anular a obrigação de indenizar. Por exemplo, os Termos de Uso da Microsoft estabelecem que a indenização por danos diretos será limitada ao valor pago pelo serviço no mês em que ocorreu o prejuízo ou até USD$10,00, se os serviços forem gratuitos.
Portanto, as cláusulas de isenção total de responsabilidade e as cláusulas de limitação do quantum indenizatório simbólico incluídas em Termos de Uso não são amparadas pelo ordenamento jurídico brasileiro. Tais cláusulas violam diretamente o direito à indenização garantido pela Constituição Federal e pelo Código Civil. Reconhecendo-se a aplicação do CDC nas relações entre provedores de serviços online e usuários, é imperativo também aplicar o princípio da reparação integral dos danos, conforme estabelecido no art. 6º, inc. II, do CDC e no art. 25, que proíbe cláusulas contratuais que impossibilitem, exonere ou atenue a obrigação de indenizar. O Marco Civil da Internet também reforça a responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades, prevendo casos de responsabilização civil dos provedores de serviços online em seus artigos 19 e 21.
Em conclusão, é essencial que os usuários estejam cientes dos Termos de Serviço das plataformas digitais e de suas limitações de responsabilidade. É fundamental que os provedores de serviços online respeitem os direitos dos consumidores e que as cláusulas contratuais sejam redigidas de forma clara, justa e em conformidade com a legislação vigente.
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