Stefano Maximo Lopes
01/12/2023
Decisão proferida pelo STJ no REsp 2.019.136-RS, publicada em 23/11/2023, estabeleceu que “o fato de o consumidor registrar negativação nos cadastros de consumidores não pode bastar, por si só, para vedar a contratação do plano de saúde pretendido.”. De acordo com a decisão colegiada da Corte, a recusa na prestação de serviços essenciais representa uma clara violação à dignidade humana, sendo também incongruente com os fundamentos estabelecidos no Código de Defesa do Consumidor.
A situação iniciou-se quando uma consumidora ingressou com ação perante o TJRS após tentar contratar um plano de saúde junto à UNIMED e ter seu pedido negado em razão de restrições/negativações em seu CPF.
Em primeira instância, a decisão proferida determinou que a UNIMED efetue a contratação conforme pretendido pela consumidora. Em segunda instância, essa determinação foi mantida pelo Tribunal, o qual asseverou, entre outros fundamentos, que “não se pode presumir que o consumidor não irá cumprir com o pagamento das mensalidades cobradas pelo segurador e, com isso, vedar acesso a direito garantido constitucionalmente”.
Diante disso, a UNIMED interpôs Recurso Especial sustentando que pode, sim, se negar a prestar o serviço à consumidora, posto que não há nenhum impedimento legal para tanto. Alega que, ao levar em conta a restrição no CPF da consumidora, no caso concreto, apenas atua com sua liberdade de contratar. Aduz que, legalmente, apenas há proibição de recusa de prestação de serviços quando esta recusa ocorrer em razão de idade ou de condição de pessoas com deficiência.
A Ministra Relatora do Recurso, Nancy Adrighi, entendeu assistir razão à UNIMED e opinou pelo provimento do recurso. Em seu texto, ela assevera que não se pode obrigar à operadora do plano a firmar contrato com consumidores cujo nome tenha sido negativado, posto que a análise das restrições serve para “evidenciar possível incapacidade financeira para arcar com a contraprestação devida”.
Além disso, a Ministra estabeleceu que “a recusa, pela operadora, de contratar com quem possui restrição de crédito não será abusiva, exceto se o consumidor se dispuser ao pronto pagamento do prêmio, prática essa, todavia, que não é usual nos contratos de plano de saúde, nos quais, em regra, o pagamento ocorre mediante prestações mensais, sobretudo quando envolvem o pagamento de coparticipação e franquia pelo titular”. Todavia, teve sua posição vencida pelos demais votantes.
O entendimento colegiado, primordialmente, assevera que os planos de saúde prestam serviço essencial, de utilidade pública. Por essa razão, a demanda não pode ser vista pelo prisma individualista, sob o aspecto unicamente de utilidade ou economia, mas também pelo “sentido ou função social que tem em comunidade”.
Além disso, os Ministros julgam que a presença de uma restrição em nome de um indivíduo não significa, necessariamente, que deixará de cumprir com uma nova obrigação avençada. Aduzem, ainda, que, caso isso aconteça, e caso o consumidor deixe de pagar a mensalidade, essa situação causará o inadimplemento, que é regulado pela legislação. Com o inadimplemento, sim, poderá a operadora deixar de prestar os serviços.
Portanto, nota-se posicionamento do STJ que reforça a saúde como um direito a ser assegurado pelo Estado e que, mesmo em situações de saúde suplementar, como a prestação de serviços contratuais de plano de saúde, a importância social deve prevalecer sobre a finalidade capital da contratação, sem que isso configure violação ao pacto contratual ou à liberdade de contratar.
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